20 de fev. de 2009

Falácias de ênfase e o noticiário político regional

Falácias de ênfase se referem às ênfases que geram interpretações múltiplas (e, freqüentemente, enganadoras). Cabeçalhos de jornais, multas de contratos e formulários de inscrições para concursos são fontes costumeiras de falácias de ênfase.

Exemplo:

200.000 VAGAS NO SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL
Já saíram os editais para os concursos
Que ocorrerão até 2015

Solução:

A primeira e mais enfática linha devido ao tamanho da fonte induz o leitor a acreditar que existem 200.000 vagas no serviço público federal ainda este ano/imediatamente. A segunda nos faz supor que os editais já estão disponíveis. A terceira, em letras miúdas, que dificilmente serão lidas, nos força a interpretar novamente toda a mensagem e reinterpretar a oferta de vagas efetiva. Acreditar nas primeiras duas linhas nos conduz a conclusões errôneas sobre a real quantidade de vagas que o comprador desavisado do jornal de concurso poderá efetivamente prestar. Contudo, devido às ênfases dadas, o leitor conclui lendo apenas a primeira linha que existem 200.000 vagas sendo efetivamente ofertadas. Inferir tal conclusão é cometer a falácia da ênfase.


Infelizmente nosso noticiário político regional oferece mais uma safra de falácias. Em ZH de hoje, dois títulos infelizes, que induzem o leitor ao erro, e contradizem o conteúdo das notícias:




No corpo da notícia se lê um detalhado relato das suspeitas, que fecham com investigações já em curso pelo MPF, Polícia Federal etc. com farta documentação sobre as atividades ilícitas dos suspeitos. O título da matéria, contudo, leva o leitor ao engano ao enfatizar que as denúncias foram apresentadas sem provas, como se a conformidade com os fatos e as reações dos acusados não fosse indício - por certo insuficiente - mas ainda assim forte indício de que eles tenham sido, de fato, filmados rapinando o erário.

A segunda falácia de ênfase do noticiário político de hoje encontramos sob o seguinte título:

Procurador desmente afirmações

Ganha um pirulito quem acertar as afirmações que o procurador desmente...

Não são as nove acusações do PSOL, como a associação com o primeiro título poderia nos levar a supor. Não são as seguintes nove acusações que o promotor desmente, a saber (via RS Urgente):

1) Áudio e vídeo mostrando representante da Mak Engenharia entregando 500 mil para a campanha de Yeda na presença de Chico Fraga, Aod Cunha, Rubens Bordini, Delson Martini, Lair Ferst e Marcelo Cavalcante;

2) Áudio e vídeo de representantes de empresas fumageiras entregando 200 mil para Aod Cunha e Lair – na conversa, Lair diz que não poderia dar recibo a pedido de Yeda

3) Lair Ferst relata conversa que seria sobre a repartição do dinheiro do Detran entre ele, Yeda, Vaz Netto e Maciel. Lair oferece 100 mil por mês para Yeda para manter o esquema e ela responde: por 100 mil eu não me levanto da cadeira.

4) Áudio e vídeo de José Otávio Germano entregando 400 mil em espécie, do dinheiro do Detran, para caixa 2 do segundo turno da campanha de Yeda. José Otávio diz que aquela era uma ajuda para obter crédito político. Presentes: Lair, Yeda e Marcelo Cavalcante.

5) Longo vídeo de conversa de Lair com o corretor Albert sobre a formatação da compra da casa de Yeda. Bem detalhado. Lair entrega 400 mil em dinheiro vivo para o corretor. Dinheiro este além dos 750 mil pagos formalmente. Neste vídeo são citados nomes de 20 pessoas, entre eles o marido Crusius e vários secretários;

6) Áudio e vídeo de distribuição de pacotinhos de dinheiro para várias pessoas cujos nomes não são conhecidos. Quem aparece distribuindo (e inclusive a expressão "mensalinho" é dita por alguém) é Valna Villarins (assessora de Yeda) e Delson Martini. Testemunham o fato: Lair e Marcelo.

7) Áudio e vídeo de Humberto Busnello entregando 200 mil para o caixa dois da campanha de Yeda para Aod Cunha. Lair testemunha.

8) Áudio e vídeo de uma longa explanação de pagamentos de contas particulares da governadora, supermercado inclusive. Alguma coisa envolvendo empresas de publicidade – DCS entre elas. Presentes: Lair e Marcelo.

9) Diálogo sobre reforma da casa de Yeda feita pela Magna Engenharia. Lair é que está negociando.

Bom, se não são essas nove acusações, quais afirmações o promotor está desmentindo?

O Promotor:
"(...) negou ter conhecimento das gravações referidas pelo PSOL e que estariam em poder do Ministério Público Federal (MPF)."
"(...) negou que um depoimento de Marcelo Cavalcante estivesse marcado"
Muito embora, "a informação de que Cavalcante prestaria depoimento ao MPF havia sido confirmada a Zero Hora pela viúva de Cavalcante, Magda Koenigkan, em entrevista por telefone, na quarta-feira" e não pelo PSOL.

Conclusão: O promotor não desmentiu as afirmações do PSOL, pois não tinha conhecimento delas. O promotor também não desmentiu as afirmações do PSOL, que o depoimento de Cavalcante estivesse marcado, mas desmentiu, isso sim, as afirmações de ZH!

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